segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Cenourinha e batatinha

Foto: Google Imagem
Quando criança eu adorava ficar prestando a atenção no movimento dos trens. Passávamos de carro nos arredores da linha férrea, no começo da Avenida Brasil, em Suzano, no sentido Poá e eu sempre torcia para o trem passar. Ainda não havia esses muros de concreto de hoje que nos impede de ver o que acontece na linha férrea. Eu torcia para que a passagem de nível fechasse na hora em que íamos cruzar os trilhos. De dentro do carro eu observava ao máximo aquele longo veículo trafegar pelo caminho de ferro. Suzano tinha uma passagem dessa no final da Avenida Roberto Simonsen, que foi extinta após a construção do viaduto Ryu Mizuno.

Eu tinha uns 8 anos. Apelidava os trens de “cenourinha” e “batatinha”. As velhas composições pertenciam a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) que controlava o transporte ferroviário em SP naquela época. Cenourinha, eram os trens com detalhes alaranjados. Batatinha os amarelos. Hoje em dia nem imagino qual apelido as crianças dariam aos trens. Aliás, nem sei se as crianças de hoje tem tempo para observar trens. 

Havia um estigma na época: andar de trem é perigoso. O transporte público ferroviário era rodeado de histórias de violência. Vândalos costumavam atirar pedras nos vagões, que quase sempre circulavam de portas abertas. Lembro dos “surfistas de trem” que arriscavam a vida no teto dos vagões, dividindo espaço com a linha de alta tensão. 

Diferente de hoje, as composições andavam no limite da capacidade somente nos horários de pico. Esse foi o argumento usado por mim quando pedi para meu pai nos levar [eu e meu irmão] para andar nos velhos carros da CBTU. Quando tinha uns 10 ou 11 anos cismei que queria viajar nos vagões. Tinha muitas dúvidas: de onde os trens vêm e para onde vão. Como é dentro das estações e dos vagões. Meu pai respondia o que dava e eu me convencia com os argumentos dele. Nas férias escolares de julho, no final dos anos 80, embarcamos na Estação de Suzano, sentido São Paulo.


Foto: Google Imagem
Lembro da grande escadaria [que ainda era de madeira]. Na plataforma ficamos aguardando a chegada do trem, que na naquela época passava de 20 em 20 minutos. Recordo que olhava fixamente para os dormentes fixados no chão sobre pedregulhos. Observava as pessoas e a voz do alto falante. O trem apontou lá longe, do lado direito, fazendo uma curva e logo chegou à plataforma. Embarcamos sentido São Paulo. 

O teto era alto e não tinha como segurar naquelas antigos ganchos. Achei estranho o balanço nos vagões e aquele barulho cadenciado, porém, o que mais me chamou a atenção foi o movimento dos ambulantes. A fala estridente dos vendedores oferecendo produtos de forma repetitiva. Fomos até a Estação Artur Alvim. Desembarcamos e ficamos aguardando o outro trem para retornarmos a Suzano. Do lado de fora da estação havia uma movimentação de operários. Na época, meu pai me explicou que se tratava da construção de uma linha metrô. Eram as obras da linha vermelha. 

A volta foi ainda mais interessante, pois sem a carga de ansiedade, pude observar ainda mais o caminho feito pelo trem. Retornei a Suzano satisfeito pela viagem. Foi a realização de um desejo. 
Só que a viagem de trem me levou a outras três vontades: andar de metrô, ganhar um Ferrorama e outro que eu ainda não realizei. Meu terceiro desejo é viajar na cabine do maquinista. Quem sabe um dia, rs! 

Nenhum comentário:

Postar um comentário